sexta-feira, 29 de abril de 2011

O caso de Realengo

O caso de Realengo é infelizmente, apenas um dos casos de bullying mais conhecidos. Infelizmente porque ocorreu e infelizmente por que ao mesmo tempo, no mundo inteiro, estavam a ocorrer casos semelhantes embora em uma dimensão mediática menor. Infelizmente ainda também, porque depois desse incidente, continuaram a ocorrer e pior ainda, irão continuar a ocorrer por tempo indefinido.

Mas será este um mal recente da nossa sociedade? Ou como noutros casos, também remonta ao princípio dos tempos, podendo ser quase considerado como congênito? Apenas nos preocupamos mais agora devido à dimensão de alguns casos e, sobretudo à sua midiatização à escala planetária.

Qual o nosso papel? O que podemos fazer? São questões que nestas situações muitos de nós nos colocamos, na maior parte das vezes pensando: não tenho nada a ver com isto, não posso fazer nada, o homem é um assassino e deve ser preso ou até morto quando ele mesmo não se suicida como foi o caso. Coitados de todos aqueles que foram vítimas, famílias etc.

Mas será mesmo assim? Ou será que cada um de nós pode fazer a sua parte e contribuir para que situações destas não se repitam? Pessoalmente considero um ponto de vista mais interessante o fato de poder fazer alguma coisa. Se observarmos a história universal verificamos que na grande maioria dos casos foram individualidades que mudaram o mundo. Mesmo nos poucos casos em que grupos mudaram algo, por detrás sempre se encontrava uma individualidade.

Assim repito, todos nós podemos contribuir para a mudança daquilo que consideramos injusto, fazendo a diferença deixando de ser apenas mais um, igual a tantos outros que se lamentam e ficam a ver a caravana passar.

Sim, mas aqui neste caso do bullying que é que eu posso fazer de concreto?

Comecemos por definir o que é o bullying.

Segundo a revista Nova Escola (ver http://revistaescola.abril.com.br/crianca-e-adolescente/comportamento/bullying-escola-494973.shtml), bullying é uma situação que se caracteriza por agressões intencionais, verbais ou físicas, feitas de maneira repetitiva, por um ou mais alunos contra um ou mais colegas. O termo tem origem na palavra inglesa bully, que significa valentão, brigão. Mesmo sem uma denominação em português, é entendido como ameaça, tirania, opressão, intimidação, humilhação e maltrato.


O bullying pode ocorrer em qualquer contexto social, como escolas, universidades, famílias, vizinhança e locais de trabalho.

O que, à primeira vista, pode parecer um simples apelido inofensivo pode afetar emocional e fisicamente o alvo da ofensa.

Esta é apenas uma definição mais relacionada com o ambiente escolar. Porém no último parágrafo o autor fala de “simples apelido inofensivo” que “pode afetar emocional e fisicamente o alvo” da “ofensa”.

Independentemente da definição e/ou da correção da mesma, o que a palavra reflete é uma forma de falta de respeito entre “seres humanos”. Uma falta de SER!
Se observarmos bem, essa mesma falta de respeito grassa por toda a sociedade assumindo outros contornos e utilizando outras palavras pomposas de preferência estrangeirismos porque cai melhor, é mais chique. Apenas como exemplo cito o caso do hooliganismo no futebol.

Ah, mas não estou sendo muito radical? É possível, mas o resultado da irresponsabilidade também é radical como se viu no caso de Realengo. E como me ensinaram no campo, quando queremos carpir alguma terra também temos que ser radicais não deixando nenhuma raiz na terra para que não volte a crescer. Estaremos a falar então de radicalidade ou pelo contrário, estaremos a ser demasiado permissivos enquanto seres humanos, contribuindo assim de forma indireta para que estas situações se perpetuem.

Talvez seja o momento para repensarmos de uma forma profunda o modelo de sociedade em que vivemos, onde gostaríamos de viver e o papel de cada um de nós nessa transformação.

Tal como um corpo que de uma forma grosseira é um aglomerado de células com diferentes atributos e com um objetivo próprio básico de sobrevivência em primeira análise e de vida qualificada se forem satisfeitas as suas necessidades mais básicas de alimentação etc., uma sociedade é um conjunto, neste caso, de indivíduos também eles com um ou mais propósitos. Neste contexto quais são os seus propósitos de vida e quais os propósitos que supõe ter a sociedade em que vive?

O caminho da autodestruição como já aconteceu com tantas outras sociedades no passado ou pelo contrário, o caminho do despertar, da conscientização, do SER?

Você é uma importante parte do corpo social e a sua responsabilidade em tudo o que se passa na sociedade é enorme, bem maior do que aquilo que pensa, mesmo que ache que não ou que ainda não tenha tomado consciência disso.
Esta semana atendi uma senhora que me comentou que a sua filha tem o hábito de dizer à filha de 3 anos: “você é uma sem vergonha.....” ao que a senhora retruca: “não digas isso à tua filha”. Observe agora qual foi o comentário da mãe da criança, como o de muitas outras mães, pais, etc. : não faz mal mãe, é apenas uma brincadeira, um tratamento carinhoso!!!

Será? Este é uma das grandes questões e quantos de nós fazemos isso, aceitamos que outros façam porque não tem nada a ver conosco, dizemos que não faz mal nenhum porque a criança ainda é “pequena” (será? ..pequena em que aspecto?), dizemos que é apenas uma forma de tratamento carinhoso ...ou que são os colegas do meu filho que lhe chamam nomes porque eu não faço isso, etc.

Admitamos que a mãe possa ter emitido o seu pensamento com amor (o que é muito questionável numa pessoa verdadeiramente consciente), mas qual a garantia de que a criança o vai receber da mesma forma? A melhor maneira de assegurar que não provoca danos é nem sequer o dizer. Há tantas outras coisas que podem ser ditas para mostrar amor e carinho pelas crianças.

E no final quando se dão os Realengos, como já disse antes, eu não tenho nada a ver com isso e coitadas das vítimas e seus familiares. O grande malandro e o grande culpado têm que ser punido se não se suicidou como foi este o caso. Quanto tempo e quantos casos destes terão que se dar ainda para compreendermos que não há coisas boas nem más, existem apenas situações como esta que aparentemente e numa certa perspectiva é má, mas que pode servir de ponto de partida para uma verdadeira transformação interior à escala global, o que é bom....!!!!!

É preciso parar, sim parar, mas com consciência, não porque alguém escreve que é preciso parar de chamar gordinho ao filho, Zézinho, seu bobo, é uma gracinha, sem vergonha, etc. mesmo que seja com muito carinho!!! E é preciso alertar outros que acham que não têm problema chamar todas estas barbaridades, ditas de forma amorosa ou não.

Como resumo diria que, por um lado a questão do bullying não é só uma questão de chamar nomes a alguém, é muito mais profundo do que isso e por outro lado a responsabilidade da situação é de cada um de nós individualmente e não do malandro que matou as crianças de Realengo. Ele é também uma “vítima” da nossa inconsciência e irresponsabilidade. No desespero de não saber o que fazer, acabou também com a vida dele por uma causa maior. Mas será que a sociedade despertou com o ocorrido?


O Descondicionamento pode contribuir de forma decisiva para esta tomada de consciência. No caso de ser testemunha ou se encontrar numa das situações descritas e se sentir impotente sem saber o que fazer, entre em contato conosco para uma orientação prática quanto ao melhor procedimento .

Poderia ter utilizado umas palavras mais suaves, mais carinhosas, mais conformadas, menos contundentes, mais bonitas, mas de que iria servir a não ser eventualmente para poder vender muitos livros, realizar reuniões, seminários completamente estéreis, mostrar-me interessado e interventivo no tema e até quem sabe, ganhar algum status social?

Poderia fazer uma análise profunda do processo psicológico que envolve todos os componentes de uma situação de bullying, como por exemplo o perfil da mãe que chama a filha de sem vergonha e diz que é por amor (porque faz isso e porque o justifica dessa maneira) e o perfil da filha que recebe essa mensagem (quais as consequências do que escuta em função da sua maneira de ser com mais ou menos autoestima, etc.), mas deixo-a para o atendimento individual e para uma obra a publicar em futuro próximo.

Infelizmente ao contrário do provérbio “à semelhança do que se passa em nossas próprias vidas, parece que não acordamos nem com o amor nem com a dor”, ou será que sim, acordamos? A decisão é sua!

(As minhas palavras não são de defesa do ocorrido, das crianças que faleceram nem da pessoa que as matou e se matou de seguida. Embora possamos ainda não o entender, nada acontece por acaso)